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Poemarte

Poemarte

21
Mar18

Rosas

Susana

 

As Rosas

Rosas que desabrochais,
Como os primeiros amores,
Aos suaves resplendores 
Matinais;
Em vão ostentais, em vão,
A vossa graça suprema;
De pouco vale; é o diadema
Da ilusão.
Em vão encheis de aroma o ar da tarde;
Em vão abris o seio úmido e fresco
Do sol nascente aos beijos amorosos;
Em vão ornais a fronte à meiga virgem;
Em vão, como penhor de puro afeto,
Como um elo das almas,
Passais do seio amante ao seio amante;
Lá bate a hora infausta
Em que é força morrer; as folhas lindas
Perdem o viço da manhã primeira,
As graças e o perfume.
Rosas que sois então? – Restos perdidos,
Folhas mortas que o tempo esquece, e espalha
Brisa do inverno ou mão indiferente.
Tal é o vosso destino,
Ó filhas da natureza;
Em que vos pese à beleza,
Pereceis;
Mas, não... Se a mão de um poeta
Vos cultiva agora, ó rosas,
Mais vivas, mais jubilosas,
Floresceis.
 
© Machado de Assis
 
Arte © Pierre Auguste Renoir 
 

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21
Mar18

Sorri

Susana
(SORRI! - Permite-te gostar de sorrir...)
 
Tens dias em que te faltam uns metros e o mundo,
uma mão e um corpo,
uma palavra e as outras - como cerejas,
e um ombro ao pé do rio
(o de um amigo).
Dizes que chorar no abraço de alguém
a quem dizes como vais te lava a alma
e te faz escorrer as lágrimas como a água da chuva
a caminho do mar
(das tuas mágoas).
Precisas disso – é o que mais dizes.
Mas um amigo é vento:
é o que te soa no sopro como a sua voz, na verdade,
mas é mesmo o vento
que aparece em tempo
para afastar os cantos dos teus lábios um do outro,
como se cada um fosse uma nuvem
e, entre eles, descobrisse um teu sol.
(Deixa que o destapem, é um sorriso.)
 
© Sérgio Lizardo
 
Imagem do Google
 

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21
Mar18

Outonos

Susana


Vivo mais um outono. O da dança das estações e o da dança dos muitos anos que visto. Gosto do cheiro da terra que acorda espreguiçando-se no orvalho que se despede do verão, das cores ocres, castanhas e ouro-velho que as plantas e as folhas das árvores ostentam com um orgulho límpido, das nuvens que dão os primeiros passos para esconderem, ciosas, o brilho do sol, das gotas de chuva que lavam os troncos nus porque a sua roupagem se transforma em tapete crepitantemente macio sob os passos ligeiros ou vagarosos. E ainda que sinta saudades do ar morno das manhãs, das horas que se prolongam em demorados crepúsculos, aprendo a sorrir ao despertar tardio das madrugadas e às noites que chegam em prematuras penumbras. Era outono no tempo em que nasci. É outono na contagem do tempo que me foi dado. São cada vez mais azuis todos os outonos que ainda puder esperar, viver e amar…

© Rita Pais 
 
Arte © Paul Gaugin
 

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21
Mar18

POEMA LXXXIV

Susana



Quando falas do real,
queres realmente dizer o quê? Reais
são as tuas mãos e os meus versos, real é a sopa e a conversa,
real é o aborto e o sofrimento, a miséria e a loucura
mesmo antes de eclodir na tua cabeça.
Real é o que, não o sendo, é realidade para ti. Real
é o amor, o café da manhã, o pensamento vingativo
a caminho de uma realidade que há-de vir a ser.
Quando falas do real, falas apenas de um pedaço do real,
como se falasses da laranja inteira tomando a casca pelo todo.
Fala-me, então, do real.
Fala-me de como anoitece em ti. E das luzes que acendes
por dentro, para que possas, às claras, ajustar contas com o
sonho.
E fala-me da realidade que não conheces.
Diz-me se por todo o lado vês a mão de Deus,
a sua obra, o seu toque, o seu perfume. Diz-me se Deus é real
ou se é uma realidade imaginada. Deus é grande,
Deus está comigo, Deus está contigo, mesmo quando estamos
em disputa.
Que realidade é esta? Acreditas em ti? E Deus acredita nele?
Deus terá decerto uma ideia acerca de si mesmo
que não é exactamente a tua. Ou não é nenhuma? Ou
a realidade não existe? Ou ela é apenas a soma de todas
as realidades?
Um jogo virtual é uma realidade. Quando jogas,
fazes um jogo virtual na realidade, ou um jogo real virtualmente?
Como já disse,
a primeira realidade sobre o que oiço falar
é que nunca sei se estou a ouvir falar da realidade. Mas quero
ouvir-te.
Quero ouvir-te como
oiço o vento, o mar e o lagarto rastejando,
como oiço a chuva e o choro e a ambulância. O que
é real. O que é realmente real. Assumidamente real. Quero
ouvir-te, na realidade. Escutar os teus olhos,
o teu cérebro e a tua boca. Num discurso
que desafie os meus ombros, as minhas certezas, a minha
convicção
inabalável de que a realidade tem às vezes muito de real
quando se constrói com o sonho, a liberdade e a consciência
de que tudo é real quando já nada é real,
de que nós fazemos a realidade e de que a realidade nos faz,
e dela somos filhos, e pais, e a ela pertencemos
porque ela nos pertence tanto como tudo o que
realmente não existe e, por esse motivo,
é ainda mais real.
Quando falo do real,
quando falas do real,
quando falamos do real, queremos,
na realidade, dizer o quê?

 
© Joaquim Pessoa

Foto © Yuna Parmentier
 

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20
Mar18

Pai

Susana

PAI

*

Na tua casa havia uma aldeia
onde sempre foste todos os habitantes.
O ar vinha cantando dos campos da lua,
entrava em festa pelas frestas, pelas ruas,
doirando até à pele. Com ele chegava o aroma
do alecrim e da resina, da primeira lã dos cordeiros.
Tomaste para ti um nome que era todos os nomes,
aquele que pode mover todas as coisas, que pode ser
todas as coisas, o que todas as coisas comentam e festejam.
O nome dos pastores e dos lumes. Nome de reis
e artesãos. De escribas. E das crias
dos cães que povoavam os desertos.
Em todas as casas havia o teu nome
numa aldeia. Onde todos os habitantes
foram sempre tu. E onde a lua vinha cantando
dos campos, quando a festa do ar entrava
pelas frestas da pele com o aroma dos cordeiros.
Doiraste o alecrim e a resina. E tomaste
todas as coisas no teu nome. O nome
que todos os nomes comentam e festejam.
Em nome do nome de crias e pastores.
Em nome do nome de reis e artesãos.
Em nome dos lumes e dos cães. E em nome
dos escribas que povoam os desertos.

*

© Joaquim Pessoa, In NOMES.

Arte © Heidi Mallot

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20
Mar18

Dorme, meu amor

Susana

Dorme, meu amor

Dorme, meu amor, que o mundo já viu morrer mais
este dia e eu estou aqui, de guarda aos pesadelos.
Fecha os olhos agora e sossega o pior já passou
há muito tempo; e o vento amaciou; e a minha mão
desvia os passos do medo. Dorme, meu amor -

a morte está deitada sob o lençol da terra onde nasceste
e pode levantar-se como um pássaro assim que
adormeceres. Mas nada temas: as suas asas de sombra
não hão-de derrubar-me eu já morri muitas vezes
e é ainda da vida que tenho mais medo. Fecha os olhos

agora e sossega a porta está trancada; e os fantasmas
da casa que o jardim devorou andam perdidos
nas brumas que lancei ao caminho. Por isso, dorme,

meu amor, larga a tristeza à porta do meu corpo e
nada temas: eu já ouvi o silêncio, já vi a escuridão, já
olhei a morte debruçada nos espelhos e estou aqui,
de guarda aos pesadelos a noite é um poema
que conheço de cor e vou cantar-to até adormeceres.

© Maria do Rosário Pedreira
 

 

20
Mar18

É por ti que escrevo

Susana

É por Ti que Escrevo

É por ti que escrevo que não és musa nem deusa
mas a mulher do meu horizonte
na imperfeição e na incoincidência do dia-a-dia
Por ti desejo o sossego oval
em que possas identificar-te na limpidez de um centro
em que a felicidade se revele como um jardim branco
onde reconheças a dália da tua identidade azul
É porque amo a cálida formosura do teu torso
a latitude pura da tua fronte
o teu olhar de água iluminada
o teu sorriso solar
é porque sem ti não conheceria o girassol do horizonte
nem a túmida integridade do trigo
que eu procuro as palavras fragrantes de um oásis
para a oferenda do meu sangue inquieto
onde pressinto a vermelha trajectória de um sol
que quer resplandecer em largas planícies
sulcado por um tranquilo rio sumptuoso


© António Ramos Rosa

Arte © Ivan Kulikov

 

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20
Mar18

Chamo-te

Susana

Chamo-Te porque tudo está ainda no princípio
E suportar é o tempo mais comprido.

Peço-Te que venhas e me dês a liberdade,
Que um só dos teus olhares me purifique e acabe.
Há muitas coisas que eu quero ver.
Peço-Te que sejas o presente.
Peço-Te que inundes tudo.
E que o teu reino antes do tempo venha.
E se derrame sobre a Terra
Em primavera feroz precipitado.

© Sophia de Mello Breyner Andresen
 
Arte © Filppo Pallizi 
 

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